Em entrevista exclusiva a Tilt, astrônomo Mike Brown explica em que pé está a busca pelo misterioso planeta X...
Minha Vó Tem Muita Joia Sempre Usa No Pescoço. Talvez você já tenha recorrido a esta frase nos tempos de escola para lembrar a ordem dos planetas Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão. Aí, Plutão foi rebaixado e sobraram 8. Depois, uma nova descoberta deixou tudo mais confuso. Em janeiro de 2016, astrônomos do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia) publicaram um estudo no Astronomical Journal que abalou as estruturas da ciência mundial: cálculos sugeriam que o Sistema Solar contaria com um nono planeta na sua periferia. Passados mais de três anos, ainda não tivemos uma prova física ou visível de que o tal planeta exista. Isso é encarado como algo natural para a ciência, mas nos deixa com a pulga atrás da orelha. Será? Mike Brown, um dos autores da pesquisa, explica que a falta de observação não diminui a certeza. Ele passou os últimos anos juntando mais evidências e agora nos conta tudo.
Não é de hoje que os cientistas buscam esse planeta misterioso, que antigamente era chamado de planeta X. Há mais de cem anos especula-se que um grande objeto cause perturbações em Netuno e Urano. Por muito tempo pensou-se, inclusive, que Plutão seria esse misterioso corpo celeste. Cálculos na década de 90 feitos com a massa precisa de Netuno, no entanto, descartaram anormalidades e, então, geral pensou: "beleza, não tem nenhum planeta por aí". Até que os astrônomos Mike Brown e Konstantin Batygin bagunçaram a ciência de novo ao notar uma anormalidade nas órbitas de corpos no Cinturão de Kuiper — uma região cheia de objetos (incluindo Plutão) que fica após Netuno.
Eles trouxeram novos cálculos para provar uma teoria: só um planeta absurdamente massivo nos confins do nosso Sistema Solar justificaria essas discrepâncias. O inquilino puxaria e empurraria os objetos presentes no cinturão e explicaria outros mistérios como:
uma inclinação de 6 graus no Sistema Solar
as órbitas dos Centauros (objetos distantes), que fazem movimento perpendicular ao dos nossos planetas.
E sabe quem nos ajuda a calcular tudo isso? O telescópio japonês Subaru, que fica no topo de uma montanha no Havaí, a mais de 4.000 m de altitude — tão alto que os astrônomos contam até com tubos de oxigênio. Ele é gigante, tem 8,2 m de comprimento, e consegue observar uma área mais abrangente do céu, ao contrário do Hubble, que funciona melhor nas buscas por objetos já conhecidos, em regiões fechadas do Espaço.
O problema é que o instrumento é tão disputado por cientistas do mundo todo que não pode ser usado por muitos dias seguidos, o que atrapalha a caçada. Mas é graças ao Subaru que Brown e Batygin conseguem, mesmo sem ter ideia de onde essa massa está, fazer cálculos, captar imagens e projetar no céu um caminho feito pelo suposto planeta. Para isso, o telescópio tira várias fotos em sequência e manda para um software, que as compara para achar objetos que teriam se movimentado entre uma noite e outra. São bilhões de pontinhos luminosos que devem ser analisados. Sim, é como procurar uma agulha no palheiro.
Ficar perguntando se falta muito não ajuda a encurtar a distância até a descoberta. Desde o anúncio do nono planeta, sabe-se que essa busca poderia levar anos.
"O céu é um lugar grande e não muito claro", brincou Mike Brown, quando perguntado sobre a demora.
"Muito do nosso trabalho desde 2016 tem sido estudar a física do planeta nove e usar isso para melhorar nossas previsões de para onde olhar. Agora nós já temos um mapa muito preciso do caminho do nono planeta pelo céu e nossa busca por seu trajeto está em andamento", explicou.
Conversamos com Renato Las Casas, coordenador do grupo de astronomia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), para entender melhor essa dificuldade. Segundo ele, além de não sabermos claramente a órbita que ele faz no céu, o planeta misterioso estaria situado a uma distância muito grande da Terra e do Sol. Isso quer dizer que ele tem baixa luminosidade - ou seja, é preciso procurar uma agulha que não brilha muito no palheiro. "Não sabemos direito nem para onde apontar os telescópios", ressalta o brasileiro.
A maior parte dos cientistas considera a teoria de Brown plausível e vê a demora em achar provas do nono planeta como normal. Primeiro, teoriza-se. Depois, comprova-se a partir de observações — estamos até hoje provando as teorias que Einstein apresentou mais de um século atrás. A revista "Science" estimou que a descoberta aconteceria cinco anos após o anúncio (então ainda dá tempo de acertar na previsão). E tudo deve ganhar novos contornos com a inauguração de um novo telescópio de oito metros no Chile, que deve desafogar o Subaru. Mas os céticos existem. Parte dos especialistas contesta o fato de a pesquisa ter escolhido só alguns objetos específicos para a pesquisa — os mais estáveis da área do Cinturão. Há quem diga que as órbitas anormais são só uma coincidência, enquanto outros acreditam que é uma concentração de outros objetos (em vez de um único grande planeta) que causa anormalidades na região. "Existe uma grande chance do Mike Brown estar correto. A teoria é muito razoável, e até mais provável, mas não é uma questão fechada e não é a única hipótese. Existem outros trabalhos sendo produzidos", afirma Tiago Gonçalves, astrônomo da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Para quem duvida, Brown responde que dificilmente outros objetos ou teorias explicariam os cálculos feitos por ele. "É inconcebível para mim que não haja um nono planeta por aí, tem simplesmente muitas coisas que anteriormente não tínhamos explicações e que o Planeta Nove explica naturalmente", já chegou a dizer. "Mas isso não significa que alguém não possa ter uma nova ideia algum dia."
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