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Nossa Senhora de Mantara (Líbano)
(1908)
É um desafio resumir as complexas circunstâncias sociopolíticas no Líbano pouco antes da aparição sagrada ali, em 1908, a primeira das grandes aparições do século XX. O Oriente Médio tem uma longa história de religiões e poderes políticos conflitantes. O Líbano fez parte do Império Otomano durante o século XVIII, mas a Inglaterra e a França tinham interesses estratégicos ali e intervinham continuamente. A hostilidade entre as diversas comunidades religiosas jamais deixou de estar presente. Os massacres dos drusos em 1860 levaram à intervenção de Napoleão III no Líbano, em 1861. Por causa da intervenção francesa, o sultão otomano foi forçado a nomear um governador católico francês para o Líbano. Como o Líbano era, em grande parte, não-católico, esse acordo político-religioso agradou a muito poucos e suas ramificações negativas ainda tinham influência em 1908.
A admirável aparição em Mantara aconteceu entre os melquitas, seita copta cristã. “Copta” deriva da palavra grega para “Egito” e os coptas da área de Jerusalém são os cristãos que imigraram do Egito para lá.
Nem ricos nem poderosos, os coptas mantêm sua posição no Santo Sepulcro em Jerusalém com firmeza em face da oposição. O altar-mor copta, que se apóia na estrutura de mármore que circunda o Túmulo de Cristo, está firmemente cercado por portas de ferro batido, no interior das quais brilham velas, lamparinas, pequenos ícones de ouro e um grande e magnífico ícone de prata, trazido do Egito, e que representa Maria com o Menino Jesus.
Em 1908, Mantara era uma cidadezinha perto de Saída, Líbano, que, na época da aparição, ainda se chamava Sidônia, um dos grandes portos marítimos mediterrâneos orientais dos fenícios, cidade muito antiga, fundada bem antes de 1400 a.C. É mencionada com frequência na Bíblia e outrora foi famosa pelos belos arvoredos de cedro (agora desaparecidos), o comércio ativo, as minas de linhita, as laranjas, os corantes púrpura e os cristais. Acredita-se que a vidraria tenha sido inventada ali na época pré-romana.
Mantara, subúrbio de Sidônia, está em um contraforte ocidental do monte Líbano. Em 1908, entre a montanha e a cidade de Sidônia, havia alguns agrupamentos de pobres choupanas. Em um desses povoados (não especificado) havia uma igreja copta cristã, próxima de uma grande gruta onde, se dizia, que no passado tinham ocorrido diversas aparições de Santa Maria Madalena e também algumas da Virgem Santíssima. Essas aparições mais primitivas levaram a descrições transmitidas de pai para filho que diferenciavam as duas Senhoras – a saber, Santa Madalena era “bela, mas não tão bela quanto a Santíssima Virgem”. Santa Maria Madalena também “não era tão majestosa, e era menor que a Santíssima Virgem e mais loira”.
A tradição afirma que a aparição de Santa Maria Madalena pediu que na gruta reinasse “total silêncio, que ninguém coma nem beba aqui”. Era “o lugar de profunda expectativa silenciosa para os que aguardavam com ansiedade a volta de Jesus Cristo”.
Assim, parece que essa tosca gruta ou caverna pouco profunda era aceita como lugar de oração silenciosa e, muitas vezes, visitada em silêncio pelos “esperançosos”. A gruta era mais profunda e maior que a de Lourdes e, dentro dela, fora construída uma capelinha com paredes e janelas que, em 1908, aparentemente estavam em abandono.
Durante o ano de 1908, muita gente relatou que um “brilho” havia começado a aparecer a intervalos dentro ou perto da gruta de Mandara, e isso foi considerado indicação de que algo especial estava para acontecer. Por causa dos relatos dos “brilhos”, o arquimandrita Nicola Halabi, de Sidônia, começou a celebrar missas ali.
Nessa ocasião, foi erguido um altar, primeiro fora da gruta e depois dentro dela. Em seguida, dois ou três cômodos de paredes de pedra (citados como “a capela”) foram restaurados. Embora a notícia do brilho na capelinha deva ter aumentado o interesse temporário pela gruta, quase quatro anos se passaram antes que alguma coisa acontecesse.
Em 11 de junho de 1911, de manhã bem cedo, o arquimandrita Halabi celebrou na gruta uma missa matinal para uns cinquenta ou sessenta fiéis, aos quais, mais tarde, muitas outras pessoas se juntaram. Depois de almoçar (evidentemente sem se lembrar da proibição de Maria Madalena), esse grupo dirigiu-se à igreja do povoado, a um quilômetro dali, e assistiu a uma pequena celebração para o vice-cônsul francês residente em Sidônia. Depois dessa celebração, por volta das cinco horas da tarde, umas cinquenta mulheres voltaram da igreja para a gruta, onde jantaram.
Lá pelas sete horas da noite, sete das mulheres aproximaram-se da gruta e de repente sentiram os olhos ofuscados por uma grande explosão de luz procedente do altar que ficava dentro da capela a aproximadamente dez metros da entrada da gruta. No começo, as mulheres pensaram que a explosão de luz fosse um reflexo do sol que se punha atrás delas. Mas a intensidade da luz aumentou e começou a irradiar muitas cores maravilhosas. As mulheres não estavam mais “em silêncio”, pois suas ruidosas exclamações atraíram outras pessoas para perto da gruta. Outras sessenta pessoas aglomeraram-se na gruta e todas foram também ofuscadas pela luz.
Parece, então, que a luz foi repentina e muito intensa e logo se viu que não era o reflexo do sol. A luz era tão forte que ninguém conseguia olhar diretamente para ela. Porém, logo depois ela se transformou em nuvens luminosas mais suaves que emitiam lindos e gloriosos raios multicoloridos e outras luzes brilhantes. Na parte central, estava uma mulher que foi imediatamente aceita como a Virgem Santíssima, porque trazia nos braços “Cristo menino”. Todos os que entraram na sala viram a aparição, que durou duas ou três horas. Pelo menos quatrocentas pessoas foram ver a aparição depois que a notícia chegou a Sidônia, onde um relato foi publicado nos jornais locais. O fluxo luminoso emanado pela aparição foi descrito como cor-de-rosa, ligeiramente ondulado e impregnado por um brilhante núcleo central de um branco dourado e puro. Esse mesmo núcleo central também caracterizava a aparição da Virgem que estava banhada nele juntamente com um “Cristo criancinha”.
Ambos estavam em silêncio, mas olhavam para a multidão aglomerada e a Virgem recebia todos afavelmente, inclinando a cabeça com movimentos dos olhos e estendendo as mãos e com um sorriso agradável. Só se via a metade superior das figuras. Era, então, uma espécie de quadro vivo que sorria e movia as mãos, ao mesmo tempo em que carregava o Cristo menino.
Durante alguns anos depois de 1911, um grande número de romeiros visitou a gruta anualmente. Mas depois que a Grande Guerra começou e ganhou terreno, esta aparição passou para a obscuridade. Além disso, por não ser uma aparição católica, alguns católicos a consideravam “contrária ao papa e fora da graça”.
Durante dois anos depois da linda aparição em Mantara, muitas vezes citada como a Sagrada Aparição do Silêncio Total, os libaneses de todas as crenças religiosas gozaram de prosperidade até o início da Primeira Grande Guerra. Porém, quando as hostilidades começaram, o dinheiro e o apoio do exterior cessaram, o turismo (importante para o Líbano) foi drasticamente reduzido e os veranistas desapareceram de vez. O Líbano foi ocupado por tropas turcas (com o apoio britânico) e os combates locais tiraram muitas vidas. Seguiu-se longa carestia que, segundo disseram, foi artificialmente engendrada pelo comando Sandjack britânico-turco.
Interior da gruta.
Imagem da Virgem Maria na entrada da gruta.